quinta-feira, 13 de agosto de 2015

Teatro Infantil Alguma história


Até meados do século XX não há no Brasil a estratégia de produção de espetáculos teatrais exclusivamente destinados ao público infantil pelo menos no sentido que hoje conhecemos, com temporadas regulares nos fins de semana. Nas décadas 1940 e 1950, com a consolidação editorial da obra de Monteiro Lobato (enredos que misturam história brasileira e universal, mitos e personagens ficcionais especialmente criados) e também com a criação (já nos anos 1960) de uma faixa de mercado da indústria fonográfica voltada para crianças (aparição dos disquinhos coloridos e “inquebráveis”, músicas de Braginha), começam a surgir peças infantis em sessões aos sábados e domingos. 
A idéia de atores profisionais (adultos), fazendo peças para crianças, se sedimenta no Rio de Janeiro na década de 40 do século XX, com a atriz e diretora Henriette Morineau (francesa radicada no Brasil e naturalizada brasileira), que lidera a montagem da peça O Casaco Encantado, de Lúcia Benedetti. Na década seguinte, aparece (também no Rio) O Tablado, companhia-escola dirigida por Maria Clara Machado. Esta dramaturga e diretora empreende uma obra em que surgem textos (hoje considerados clássicos) como Pluft, o Fantasminha, A Menina e o Vento (peça em que a criança do sexo feminino figura como protagonista, inteligente e independente, e não como a coadjuvante da criança do sexo masculino), O Cavalinho Azul (um pangaré e não o manga-larga dos “príncipes encantados”), A Bruxinha Que Era Boa, A Volta do Camaleão Alface, Maria Minhoca, Tribobó Citty, dentre outros. É Maria Clara Machado que – rompendo com o imaginário dos contos de fadas e contrapondo-se à referência e ao ideário da indústria editorial e cinematográfica (gibis e Disney) - fomenta no Teatro Brasileiro um novo paradigma: peças não-didáticas, sem a mensagem instrumental ao final, com diálogos que mesclam coloquialidade e apuro poético, investigação psicológica para além do maniqueismpo bem-mal, prêmio-castigo e personagens originais. 
Na década de 1960, esse modelo dramatúrgico (mariaclareano) é absorvido por outros autores brasileiros (Pernambuco de Oliveira com “Circo Rataplan” e Stela Leonardos com “O Consertador de Brinquedos”).
Nos anos 1960/1970, dá-se a quebra de paradigmas motivada, dentre outras razões, pela aparição de novas posturas educacionais. Na década 1970 a Lei de Diretrizes e Bases cria a noção de Educação Artística nas Escolas. Na década seguinte, o movimento pela primazia do conceito de arte-educação (com sua vocação essencialista e não contextualista-instrumental) tem repercussões no entendimento do teatro para e com crianças. Na época, a exposição excesiva das crianças à programação da TV e a massificação das revistas em quadrinhos sofrem críticas e os contos de fada readquirem prestígio pedagógico, voltando então a ser admitidos, embora reinterpretados em seus significados psicanalíticos. 
Nos anos 1990, a conduta de personagens clássicos (Caçador, Lobo Mau, Bruxas etc) tem de se adequar à concepção do conceito de “politicamente correto”. 
Hoje, em pleno século XXI, com o acesso à Internet, aos games, CD roomm, DVDs etc e com a consolidação de uma indústria editorial destinada às crianças, todas as tendências convivem: personagens do velho imaginário (folclórico/brasileiro, europeu-clássico, ficcionais e históricos) dialogam e mentalidades se entrecruzam. A própria narrativa do teatro infantil se modifica e - absorvendo o ritmo do cinema, do videoclip, da TV - fragmenta-se, embora ainda persistam pontuais interações personagens-platéia nas quais muitas vezes se confunde animação/excitação com valor dramatúrgico.

Os primeiros anúncios em Fortaleza de um teatro exclusivamente infantil ocorrem no início dos anos 1930. O Centro Artístico (Av. Duque de Caxias esquina com rua Tristão Gonçalves) mantem nesta década a sua Troupe Infantil. No entanto, o entendimento é o de que a criança não constitui exclusivamente a platéia-alvo, mas também figura como agente, ou seja, o ator. Nas décadas de 1930, 1940 e 1950 (antes da aparição de companhias de Teatro Infantil no modelo da atualidade) a expressão Teatro Mirim ou Infantil designa encenação feita por crianças e para crianças. Primeiro (na década de 1930) com textos de Wiliam Alcântara e Miranda Golignac e mais tarde (anos 1950) com adaptações de contos de fadas, fábulas etc. 
Em Fortaleza, uma segunda fase do teatro infantil se inicia com a montagem (anos 1950) da peça O Simbita e o Dragão (de Lúcia Benedeti, montagem de um grupo de origem universitária, tendo no elenco Geraldo Markan). Outro marco em nossa cidade é a fundação do Grupo Teatro de Brinquedos (de Ruy Diniz e Glice Sales/meados dos anos 1950), companhia que absorve o conceito de teatro infantil de Maria Clara Machado e produz a primeira versão cearense de “Pluft, o Fantasminha”. 
No final dos anos 1950 e na década de 1960, a Comédia Cearense e o Grupo Teatro Universitário (do Curso de Arte Dramática/CAD-UFC), sob a direção de B. de Paiva, dão seguimento à linha de atuação do Teatro de Brinquedos. Surgem, então, peças infantis de novos autores cearenses, como Eduardo Campos (“O Julgamento dos Animais”) e Carlos Paiva (Crak,Gang, Flash). Já no final dos anos 1960, Gracinha Soares (no Grupo Teatro Universitário) e Haroldo Serra (na Comédia Cearense) substituem B. de Paiva como diretores de peças infantis. A Comédia Cearense põe em cena adaptações dos chamados clássicos (Cinderela, Bela Adormecida, obra dos Irmãos Grimm, versões teatrais de obras cinematográficas etc). 
Na década de 1970, o GATI (Grupo Amador de Teatro Infantil), de Raimundo Lima (dramaturgo e encenador), cria uma dramaturgia dedicada às crianças na qual figuram peças como A Fazedora de Estátuas (1972) e O Fantasma do Paiol (1973). Nos anos 1980 há a absorção do Teatro de Animação (bonecos etc), com a aparição dos grupos Circo Tupiniquim (de Omar Rocha) e Formosura de Teatro (de Chico Alves e Graça Freitas). Augusto Oliveira (Augusto Bonequeiro/ oriundo da tradição recifense dos mamulengos) chega inclusive a montar (inicialmente no Bairro de Fátima e posteriormente na Praia de Iracema) um espaço reservado com exclusividade ao teatro de bonecos. 
Durante a segunda metade do século XX o teatro infantil em Fortaleza mantem núcleos de criação que por suas específicas linhas de trabalho consolidam identidades temáticas e estéticas. Citemos, por exemplo, os grupos Pesquisa (de Ricardo Guilherme, fundado em 1978), Balaio (dirigido por Marcelo Costa e depois por Augusto Abreu e Quixadá Cavalcante/anos 1980), Abre Alas (de Kildare Pinho) Mirante (da UNIFOR, sob direção de Hertenha Glauce e Kelva Cristina), Comédia Cearense ( de Haroldo Serra e Hiroldo Serra) e Vemart (de Cláudia Valéria). No século XXI, despontam os grupos Epidemia de Bonecos (de Isabel Vasconcelos e Cláudio Magalhães), Bricoleiros (de Cristiano Castro) e Pavilhão da Magnólia, dentre outros.

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