quarta-feira, 17 de junho de 2015

O Ensaiador e O Encenador

Primeiras décadas do Século XX: época do ponto, alguém que durante a apresentação da peça, às escondidas da platéia, soprava as falas que deveriam ser ditas pelos atores. Não havia ainda a figura do diretor que, sobretudo a partir da década de sessenta do século XX, passa a imprimir sua visão de mundo pessoal sobre um texto.

Do século XIX a meados do século XX o teatro do Brasil viveu a época do ensaiador que transpunha para o palco as rubricas do autor da peça, de modo a que os atores principais tivessem a oportunidade de ratificar seus atributos histriônicos, sem levar em conta uma articulação interpessoal de estilo. O ensaiador coordena as entradas e as saídas, os deslocamento dos personagens em cena sem no entanto arquitetar uma concepção autoral para a encenação.


O Teatro, a esse tempo, se regia pela tradição literária que os ensaiadores portugueses mantinham no Brasil desde o final do século XIX e início do século XX. Montagens e remontagens de um texto iam estratificando modos de encenar, padrões estéticos, em um tempo ainda sem a figura do encenador ou diretor que, mais tarde, emprestaria à encenação um sentido de unidade conceitual, coordenando todos os elementos expressivos do teatro para criar o que hoje denominamos de escrita cênica.

Essa “época do ensaiador” é o tempo de um teatro anterior ao modernismo e à aparição do encenador que empresta unidade ao espetáculo. É a época em que as personagens se enquadraram em uma determinada tipologia, sedimentada pelo teatro lírico e pelo teatro declamado. Os atores especializavam-se em representar protótipos cênicos - o galã, a ingênua, o caricato, o vilão etc - tipos pontuais que eram recorrentes em um vasto repertório, repertório e tipologia que posteriormente influenciaram o rádio-teatro, as novelas de televisão e os programas de humor. É, enfim, a época das operetas e sobretudo das burletas, matriz dramatúrgica do teatro cearense que reprocessa a influência da dramática popular tradicional, de acentuada tendência musical e cômica, para criar peças em que há diálogos falados e diálogos cantados.

A esse tempo, a cenografia se compunha daquilo que se convencionou chamar de cenários de gabinete. Papéis duros, resistentes, que não se rasgam facilmente, papéis de sacos de cimento, uns colados nos outros formavam uma grande tela, posta no fundo do palco. Nesta tela de papel o cenógrafo pintava o cenário: uma paisagem de fundo infinito, uma varanda florida e às vezes até prédios ao longe. Diante desse tipo de tela, os móveis que caracterizavam o local em que se passa a cena geralmente reproduziam um ambiente de sala de estar. Decorre daí a denominação dos chamados cenários de gabinete.

As peças eram classificadas por seu gênero e as encenações seguiam padrões estéticos já reconhecidos pelas incontáveis remontagens não apenas em teatros convencionais, mas também e muito nos circos. Nessa época – décadas de trinta e quarenta até meados da década de sessenta do século passado - os circos montavam espetáculos teatrais, além das esquetes, da performance dos palhaços e dos números de acrobacia, contorcionismo, malabarismo etc.


Texto de Ricardo Guilherme

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